quinta-feira, 11 de fevereiro de 2021

Cartas a todos nós

Saudades do sossego de casa, das paredes sem ecos, sem vozes, sem gritos. Só eu e o vazio.

Ou só eu e tu e o sossego que me dás. 

Desarrumo a mala e tiro do fundo a tua t-shirt com esperança que com o teu cheiro desapareçam as saudades. 

Não resulta. 

Lembro o tempo em que nas viagens de trabalho só sentia uma leve saudade do sossego e da solidão de casa. Da minha cama, da minha almofada. 

O que foste fazer Mariana ?

Agora, sozinha neste quarto de hotel friodeito-me e lembro-me de ti, dos teus cabelos ruivos sobre os meus, das nossas pernas entrelaçadas, das minhas botas pretascom atacadores lado a lado com os teus saltos altos vermelhos. 

Tenho os maços de cigarros, o teu whisky preferido, só faltas tu. 

Tornarias esta cama de hotel tão mais confortável. 

Tornas a minha vida tão mais confortável.

Levo-te um pouco de caos.

Trazes-me um pouco de calma e dançamos por entre o tempo que não temos.

Choro dos inocentes

 


As crianças riem e pulam

Os adultos fotografam 

Mas nós não nos deixamos

 contagiar pela alegria.


Aproximam-se das grades, 

Olham curiosos , 

O nosso olhar é de tristeza,  

Tentamos não parecer furiosos. 


Mais do que tristeza

O nosso sentimento é confusão 

Tiram-nos a liberdade 

Só por um pouco de diversão 


Ás quatro dançam manipulados 

Os golfinhos,  

O zoo fica mais sossegado.


Por momentos consigo fechar os olhos

e não ouvir a gargalhada infantil. 

Pensar nas horas que não dormi. 

Por momentos fecho os olhos

e finjo que não estou aqui.

Vida corrida

Corro para o autocarro

Corro para o trabalho

Corro ao final do dia


De um lado para o outro,

Arrasto-me de cansaço.

Corro ,  corro sem parar.


Um jantar a fazer,

Uma casa a limpar,

Tanta papelada 

e ideias para organizar.


Corremos, corremos sem parar.

Tentamos ganhar ao tempo,

Corre a vida,

Deixamo-la passar. 


Quando finalmente  temos tempo

Já tanto tempo passou

Que já nem sabemos como o desfrutar.

domingo, 3 de abril de 2016

Há algo na noite que me fascina. . .
Ver a alegria que alguns ainda tem . . .
Animar os que já nao tem força para ter.
Mas adoro especialmente aquele momento em que os passaros ja cantam.
O dia começa a nascer.
Há claridade no céu.
Porem, ao mesmo tempo, as luzes da rua ainda estão acesas.

Ainda não dormi.
Ainda não é dia.
Mas tambem ja não é noite.
Gosto tanto.

sábado, 6 de fevereiro de 2016

Ouço as tuas pegadas pela casa
Ainda sinto o toque do teu beijo de despedida sempre que sais de casa de manhã e me deixas na cama
Ainda sinto o cheiro do teu perfume pregado em cada parede
Ainda te vejo no espelho da casa de banho beijando-me o pescoço enquanto tento despachar-me
Ainda ouço o eco das tuas gargalhadas na sala
E no fundo irrita-me todo este silêncio
Toda esta ausência de ti

terça-feira, 24 de novembro de 2015

Quando arrumo o meu quarto (para quem me conhece sabe que são momentos raríssimos) a casa parece que vai abaixo e o meu pai costuma dizer "não te preocupes, antes de arrumar é preciso desarrumar".
Fez-me pensar.
Será que para nos encontrarmos temos que nos perder primeiro?

domingo, 8 de novembro de 2015

Cartas a todos nós XXVIII

Hoje tatuei-me.
Tatuei-me para que um dia pudesses ver.
Tatuei-me assim simplesmente porque eu quis.
Tatuei-me assim simplesmente porque eu posso fazê-lo,
porque eu posso fazer tudo o que eu quiser.
Tatuei-me assim porque eu é que decido o que fazer com o meu corpo.
Tatuei-me assim para que um dia pudesses ver,
pudesses perceber, este corpo não te pertence a ti.
Este corpo é meu.
Só meu!

Tatuei-me para me desprender,
Tatuei-me para me agarrar.
Para me agarrar a mim,
agarrar-me ás minhas ideias, aos meus gostos, ao meu corpo.
Tatuei-me para me desprender de ti.

Desprender-me de todas as tuas ideologias, todas as tuas manias,
todos os teus preconceitos, todos os teus defeitos.
Desprender-me da ideia de o meu corpo ser teu.
Não é! Nunca mais o será! É meu e só meu!

Tentaste tantas vezes calar-me,
tantas vezes mudar-me.
Hoje ficasse eu sem voz,
ficasse eu sem memória e tu mesmo assim já não me calarias.

Está bem presente agora no meu corpo o que sou e o que quero para mim.
Já não me esquecerei.
Marcas no corpo? Prefiro que sejam de tinta.

Carta a todos nós XXVII

Casaram...
A igreja cheia.
Os noivos lindos.
Desde pequenos vizinhos.
Achavam que iam ser felizes para sempre.
Assim, também, pensava o público que os
assistia de boca aberta.
Aos poucos construíram a casa com o esforço e mãos de ambos. 
Eram românticos . 
Aventurados.
Sonhadores
Apaixonados.
Via-se nos olhos... Transbordavam de alegria.
Ela engravidou,
Prepararam o quarto
Prepararam a mente
Perderam o bebe.
Perderam-se os sonhos,
As aventuras...
Fizeram-se poupanças...
Gastaram-se poupanças. 
Ficaram os sonhos por realizar. 
Envelheceram lado a lado - como deve ser.
Não voltaram a tentar
Ambos se culpavam
Até que foi ela a partir. 

terça-feira, 3 de novembro de 2015

Cartas a todos nós XXVI

O autocarro parou.
Lá fora, sem que eu desse conta, já é noite e está escuro,
cá dentro as luzes são tão brancas tão brancas que a claridade até parece nos ferir os olhos.
Lá fora chove sem parar e cá dentro estou aqui sossegada, no meu canto, de caderno na mão, sem correr o risco de o molhar.
Não quero sair.
A escuridão chega a assustar.
E aqui estou tão quentinha, tão cómoda.
É já o inverno a fazer-se notar.
E eu estou tão cansada,
tão sem forças,
que eu simplesmente ficava aqui.
Em casa espera-me uma casa fria,
vazia, no fundo, sem nada que me espere.
Porque não ficar?

Cartas a todos nós XXV

Acorda.
É como se não tivesse descansado.
Corpo dorido.
Olhos cansados.

Levanta-se, mete as torradas a fazer, a máquina do café a aquecer.
Mete a cápsula, tira o café, deita a cápsula, agora já usada, no lixo.
A torrada já saltou (como de costume já queimada).

Mete manteiga na torrada enquanto veste umas calças.
Esquece-se de pôr açúcar.
-Bah! Notasse bem a falta.

Queima a língua, larga o café.
Vai procurar uma blusa, penteia o cabelo, lava a cara.
-Muito rápido! Muito rápido!

A torrada já está fria, o café já não queima.
Come e bebe.
 - Muito rápido! Muito rápido!

Sai.
Corre pelas escadas de madeira do seu prédio
 que há muito tempo que já não é novo.

Chove torrencialmente.
Volta a cima.
Pega um casaco e um chapéu.

Volta a correr para baixo.
- Muito rápido! Muito rápido!

Corre para o metro.
Começa a ouvi-lo chegar.
-Rápido! Rápido!

Até lá apanhou molha.
 Escorre-lhe água pelo corpo,
 pinga-lhe pelos cabelos.

O motorista é simpático,
 repara e volta a abrir as portas.
Troca de linha.
- Corre, corre! Muito rápido!

Agora espera...
Outro metro.
Corre!
Finalmente chega ao trabalho.

Almoça no café da frente - Ainda faltam mais 6 horas de trabalho.
Ouve ralhar um colega com outro.
 Agonia-se, mas não se mete.
Tenta concentrar-se.
 - Mas não consegue.

Finalmente dia completo.
Agora vai de autocarro.
Felizmente há lugares. Senta-se.
- Alívio!
Esforça-se por não adormecer.

O autocarro chega ao destino.
Vai andando para casa.
Agora já não corre.

Chega a casa descalça-se.
-Alívio!
Toma um banho.
Escova
Escova
Escova
e deleita-se sob a água quente.

Não há vontade de cozinhar.
Ficasse por uma sopa embalada.
Senta-se, come, vê televisão.

Salta de canal para canal,
"nada de jeito" - pensa.
Mas resigna-se ao que há.

Vai se deitar.
-Alívio!
E amanhã é outro dia.
- Muito rápido! Muito rápido!